Apesar da saga na volta pra casa, o sábado de Zé Pereira não causou trauma. Foi uma pauleira, mas valeu. No domingo, o Recife Antigo parecia um palco, lotado, por todos os lugares, de blocos, troças, música em todas as esquinas. Aquela história que um dia já houve no carnaval da gente, de ficar parado, no silêncio e na muvuca, esperando que alguma orquestra se dignasse a enfrentar a multidão, há alguns anos não acontece mais - que ótimo. Se tem uma coisa na vida que essa prefeitura (e a anterior) sabe fazer é carnaval.
Assim que chegamos, fomos à rua da Moeda, minha casa de todos os dias, que nos recebeu com a orquestra que tocava para o Caranguejo no Caçuá. Passamos por todos os recantos, do Recbeat ao Marco Zero, e tudo estava lindo. Só ficou parado quem quis, e quem quis pôde, sim, sentar numa mesa e ver a vida passar, sem agonia.
Na segunda, o sagrado encontro no Amantes de Glória. Todos os amigos, parentes, conhecidos - brodagem, como diz Juliana. Gente pra chuchu, dessa vez o Amantes não entrou na rua do Bom Jesus, uma atitude deveras sábia. Estavam lá Alex e Tati, Sued, Ju e André, Tia Nilza, Tio Beto e Helena, Pedroca e Fernandinha, Fábio e Marcela, Gileno, Carol, Dani e Kenedy, Fabiana, Dani Lacerda, e mais e mais gente do bem. Saímos ao som do hino - "a flecha de Glória flechou"... Como sempre, ótimo.
Depois da dispersão de Glória, tentamos o samba da rua da Moeda, que estava sofrível, o povo não se entendia. Circulamos, circulamos, cansamos, esperamos. No Recbeat, eu queria ver a Ojos de Brujo, que diziam que faria um flamenco pop legal. Meia boca, o tal grupo espanhol, apesar de divertidinho. Me pareceu que eles escolheram um repertório só com rumbas por causa do carnaval, sei lá. Faltou flamenco, sobrou uma coisa meio Cubanakan. Bom. Não deu pra esperar Céu, ficou pra outra vez.
No táxi, já sabendo que the girls me iriam ser devolvidas no dia seguinte, aproveitei pra ficar cansada. E fiquei cansada mesmo, de verdade. Na terça, vi o carnaval pela TV, em casa. Vi Spock falando com Roger sobre o documentário que ele está fazendo com sete grandes mestres do frevo pernambucano, segundo ele o "Buena Vista" daqui do Recife. "Choro todo dia", ele falou, e sei que não foi força de expressão. Vi, pela Band, na Bahia, um trio com Daniela Mercury e Margareth Menezes cantando "liberdade ao povo do pelô", com aquele batuque afro precioso, e senti pena dessa turma que não comeu e não gostou. Salvador é Brasil, galera. E pense numa gente pra entender de percussão - "branco se você soubesse/o valor que preto tem/tu tomava banho de piche/ficava pretinho, pretinho também". Lindo.
Dia desses, estava comentando como é difícil pra mim viver certas paixões, geralmente racionalizo demais - esporte nenhum me empolga, não consigo me escandalizar com nada, não sou fã (admiro muito muita gente, mas não me vejo pedindo autógrafos a ninguém). O carnaval, no entanto, é diferente. Fico muito emocionada vendo aquilo tudo acontecer ao mesmo tempo, tanta gente simples que se transforma em artista, reis e rainhas em cada esquina que a gente vira. Fevereiro tem o dom de recarregar as energias para o ano que chega, tão cheio de obrigações e responsabilidades.
É incrível como o ser humano pode valer tanto a pena, quando quer. Eita, festa bonita que a gente sabe fazer! Orgulho...