terça-feira, 24 de agosto de 2010

De que arte estamos falando?

Debate sobre arte contemporânea parece um novelo de lã: a gente sabe onde ele começa, mas não tem idéia de onde vai terminar. E aí, passamos horas discutindo quais os limites do "comum", até que ponto atividades cotidianas e banais participarão do código que determina o que é ou não artístico. Difícil chegar a um consenso, mas o fato que nem todo mundo assimila a idéia de que "tudo" pode ser alçado à categoria de arte.

Eu sou uma dessas pessoas. Acho que há, sim, coisas muito interessantes nesse balaio, mas também há tanta coisa despropositada, tanta gente sem nenhum talento que acha que a graça está justo aí - na falta de talento. Cuma? Discutia com uma aluna e bailarina, dia desses, sobre dança contemporânea. Concordávamos na impressão de que os movimentos dos bailarinos dessa categoria são repetitivos e redundantes, na maioria dos grupos, com todo respeito às exceções. O interessante é que a essa dança é considerada contemporânea justamente pela ausência de um código que a represente, e mesmo assim, caiu numa mesmice aborrecida.

Enquanto isso, danças que têm códigos estruturados, como o balé clássico, o frevo, o flamenco - os quais a gente pode reconstruir, reiventar, mas precisa conhecer - são tão diversas que parecem ser, elas, as que detém maior possibilidade de interpretações criativas. Talvez sejam mesmo. Falando por mim, que danço flamenco há mais de uma década, posso dizer que não estou nem perto de conhecer todas as possibilidades que esta modalidade apresenta.

E temos um código, estruturado, que precisamos respeitar se quisermos depois mudá-lo. Os bailes, mesmo sem a "liberdade" que o contemporâneo, a priori, traria, conseguem ser muito diversos, e apresentam grande possibilidade de variações entre si. Enquanto isso, os grupos contemporâneos não conseguem se desvencilhar daquelas dissociações de corpo, giros pelo chão e saltinhos que quem acompanha dança tanto conhece... Cansa. Não emociona, pelo menos não a mim.

De repente, arte tem mesmo a ver com o incomum, com o virtuosismo, com a técnica apurada... A referência estética mais contundente é sempre aquela que te surpreende, afinal. E isso não tem nada a ver com preconceito, tem a ver com sentimento.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Tem espetáculo, sim, senhor!

Uôba. Temos data marcada para a nossa primeira apresentação, que deverá contecer, se não houver nenhuma mudança, no dia 16 de outubro. Desde que comecei as aulas com Karina, é a primeira vez em que irei dançar em público (ou melhor dizendo, para um público), e essa perspectiva sempre é muito animadora. Afinal, a gente não se esforça tanto pra tudo ficar lindo e escondido, né? Já disse uma vez por aqui, e repito: quem dança quer palco.

A projeção é das melhores, porque Karina é, sem nenhuma dúvida, a professora mais completa que já tive, e ela vem garantindo a todas nós um nível de evolução constante e rápido. E agora, que há o espetáculo no horizonte, ela deverá ficar mais exigente e acelerada. Ui. É um desafio, dos mais estimulantes, e por isso, começo hoje a ensaiar diariamente (menos nos dias em que estiver na faculdade e no domingo). Tudo pra não fazer feio na hora H - meus seletos quatro leitores, quero vocês todos lá, ok? Bom, mais adiante darei as coordenadas do show: hora, lugar, etc.

P.s.: Engraçado, um dia vinha no carro pensando sobre isso: a única hora em que não penso em nada além do que estou fazendo é quando estou dançando. É quase como uma meditação com movimento. Para nós, mulheres, sempre projetando a próxima ação enquanto executamos a anterior, é um exercício interessantíssimo. A mente fica esvaziada de tudo, principalmente das coisas chatas e estressantes. Vão lá, meninas.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Motorizada

Reconheço que nossos centros urbanos estão inchados e que as avenidas das grandes cidades não toleram mais carros. Sei que o trânsito recifense é caótico e que o ideal seria andarmos todos de transporte coletivo, aproveitando para caminhar também, quando as distâncias e o clima permitirem. Fico estressada sempre ao levar uma hora para percorrer um trajeto que, em situações ideais, seria percorrido em 10 minutos, no máximo. Sou a favor de qualquer iniciativa que ajude a diminuir a poluição do ar causada pelos veículos.

Nada disso, no entanto, me impediu de ficar MUITO feliz com o presente que ganhei do meu caríssimo pai: um carrinho novinho, só pra mim. Foi uma grande surpresa, que vai trazer muitos ganhos a à minha rotina, já que eu dividia o carango da família com my husband, o que não raro nos obrigava a fazer ginástica de tempo e de logística. Ele ainda não está comigo, mas chegará em breve, e será recebido com pompa e circunstância. Vou comprar um vinho super ótimo, daqueles que eu reclamo quando marido compra porque são muito caros, assim que estiver com as chaves.

Não disse que a lei da compensação universal haveria de me alcançar? E foi antes do que eu pensava. Delícia.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Cinco anos

Amanhã, é o aniversário de cinco anos da minha pequena Alice. Pequena, sempre, porque é a caçula, mas que de vez em quando surpreende a gente com sua tiradas quase adultas. Dia desses ela refletia, do alto da sua sabedoria infantil: "a gente não tem mesmo tudo o quer na vida". O tema que gerou a frase de efeito tinha relação com um brinquedo que ela gostaria de ganhar. Ao mesmo tempo, esta semana, para que ela comesse sem reclamar, inventamos (idéia de Julia, minha mais velha) que purê era pasta de sereia. E ela acha que, se comer aquela pastinha amarela várias vezes, vai virar sereia. É uma idade linda, de transição. E Alice (essa aí de faixa com bolinhas na cabeça), com seu bom humor, com seu jeitinho carinhoso, com sua inteligência, é um presente pra todos nós. Beijo, fofura!

terça-feira, 3 de agosto de 2010

O doido

Povo do meu Brasil, preciso contar essa história. Eis que estava eu na minha aula de flamenco dos sábados, lá no Instituto Cervantes. Estamos aprendendo agora uma bulería, baile dos mais difíceis, porque o compasso é bem acelerado, e ainda por cima tem muito jogo de corpo. Já estamos ensaiando essa coreografia há um tempo, mas ainda falta muito pra que ela fique limpa. Pois bem. Aparece na aula um homem (ou quase), dizendo-se bailarino, apto a estar em turmas avançadas. Parêntese: nós somos intermediárias, vá lá, intermediárias nível 2, mas estamos ainda distantes de ser avançadas.

Eu danço na frente do espelho, um pouco porque não gosto de ficar atrás sem me ver, um pouco porque gosto de ver bem o que a professora está fazendo (sou míope), um pouco porque detesto que aquele povo que não consegue acompanhar a aula me atrapalhe. A criatura, o tal homem, achou de, na primeira aula em que participou, "dançar" a bulería com tudo, metendo porrada no tablado, totalmente fora do compasso, do ritmo, de tudo. O coitado não tem o menor jeito pra coisa, mas acredita piamente que é a reencarnação de um cigano da Andalucía.  Detalhe: entra na aula falando espanhol - ele é brasileiríssimo, vale? Doido de batinha branca.

Aquilo foi me dando uma gastura, como diz o matuto. E eu olhava pra trás, com a cara mais feia que conseguia fazer. Nada, ele não se tocava. A aula passando, e o cara fazia tanto barulho que ninguém conseguia ouvir mais os próprios pés. Aí, não deu. O sangue subiu e eu saí do meu cantinho e fui falar com ele, dizer que parasse de atrapalhar a aula. Sou calmíssima, mas o fulano aperreou tanto que foi impossível ficar quieta. Ele olhou pra mim e só disse: "tá". E continuou tentando "adivinhar" o que íamos fazer a seguir, com a desenvoltura de um poste.

Karina, a professora, criou uma turma de intermédio 1, para quem não acompanha ainda a aula das 13h mas não é mais iniciante. Pensei comigo: "essa besta não vai sair da nossa turma, ele tem convicção de que é o bailarino flamenco do século". Dito e feito. Aula seguinte, lá estava ele, no intermédio 2, matando barata, metendo porrada, enchendo o saco de todo mundo. Dessa vez, foi ela que se danou e disse que, se ele continuasse, ia ter que pedir que se retirasse. Mas o menino nem tchuns. Ignorou-nos na forma da Lei.

Estamos ensaiando também um martinete com bengala, que requer uma coordenação motora daquelas. O cara não dá uma dentro, mas continua achando que é avançado. Jisus, que fazer? Nada dá resultado, e com doido a gente não tem muita chance só argumentando. Pensei em assassinato, mas achei muito dramático. O pior é que não temos nenhum homem na turma, e seria ótimo que aparecesse algum pra dividir os bailes conosco. Aí, aparece aquilo. Tô pagando os pecados desta e das próximas vidas. Se a lei da compensação universal existir, não é possível que os céus não estejam me reservando uma coisa muito, muito boa.