Povo do meu Brasil, preciso contar essa história. Eis que estava eu na minha aula de flamenco dos sábados, lá no Instituto Cervantes. Estamos aprendendo agora uma bulería, baile dos mais difíceis, porque o compasso é bem acelerado, e ainda por cima tem muito jogo de corpo. Já estamos ensaiando essa coreografia há um tempo, mas ainda falta muito pra que ela fique limpa. Pois bem. Aparece na aula um homem (ou quase), dizendo-se bailarino, apto a estar em turmas avançadas. Parêntese: nós somos intermediárias, vá lá, intermediárias nível 2, mas estamos ainda distantes de ser avançadas.
Eu danço na frente do espelho, um pouco porque não gosto de ficar atrás sem me ver, um pouco porque gosto de ver bem o que a professora está fazendo (sou míope), um pouco porque detesto que aquele povo que não consegue acompanhar a aula me atrapalhe. A criatura, o tal homem, achou de, na primeira aula em que participou, "dançar" a bulería com tudo, metendo porrada no tablado, totalmente fora do compasso, do ritmo, de tudo. O coitado não tem o menor jeito pra coisa, mas acredita piamente que é a reencarnação de um cigano da Andalucía. Detalhe: entra na aula falando espanhol - ele é brasileiríssimo, vale? Doido de batinha branca.
Aquilo foi me dando uma gastura, como diz o matuto. E eu olhava pra trás, com a cara mais feia que conseguia fazer. Nada, ele não se tocava. A aula passando, e o cara fazia tanto barulho que ninguém conseguia ouvir mais os próprios pés. Aí, não deu. O sangue subiu e eu saí do meu cantinho e fui falar com ele, dizer que parasse de atrapalhar a aula. Sou calmíssima, mas o fulano aperreou tanto que foi impossível ficar quieta. Ele olhou pra mim e só disse: "tá". E continuou tentando "adivinhar" o que íamos fazer a seguir, com a desenvoltura de um poste.
Karina, a professora, criou uma turma de intermédio 1, para quem não acompanha ainda a aula das 13h mas não é mais iniciante. Pensei comigo: "essa besta não vai sair da nossa turma, ele tem convicção de que é o bailarino flamenco do século". Dito e feito. Aula seguinte, lá estava ele, no intermédio 2, matando barata, metendo porrada, enchendo o saco de todo mundo. Dessa vez, foi ela que se danou e disse que, se ele continuasse, ia ter que pedir que se retirasse. Mas o menino nem tchuns. Ignorou-nos na forma da Lei.
Estamos ensaiando também um martinete com bengala, que requer uma coordenação motora daquelas. O cara não dá uma dentro, mas continua achando que é avançado. Jisus, que fazer? Nada dá resultado, e com doido a gente não tem muita chance só argumentando. Pensei em assassinato, mas achei muito dramático. O pior é que não temos nenhum homem na turma, e seria ótimo que aparecesse algum pra dividir os bailes conosco. Aí, aparece aquilo. Tô pagando os pecados desta e das próximas vidas. Se a lei da compensação universal existir, não é possível que os céus não estejam me reservando uma coisa muito, muito boa.
terça-feira, 3 de agosto de 2010
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Eu sei como é... já joguei futebol com um tal de Danilo no time, além de um tal de Rui - esse, o companheiro de pelada juba chamava de "Ruim".
ResponderExcluir- Quando eles adoeciam ou viajavam, era uma festa. Além da diminuição de lances bisonhos, as partidas eram (bem) mais disputadas.
- Moral: gente ruim (de serviço) não serve nem pra adversário.
Bj!
Minha mãe sempre nos disse, remédio de doido é outro na porta. Conselho que vos dou: tornem a vida dessa criatura um inferno, pior do que o dantesco. Tenho certeza que ele abandonará o flamenco rapidinho...
ResponderExcluirE não é que o danado faltou na última aula? Que benção! Cheguei em casa, e Clero logo falou: "o cara não foi, né?" Ele percebeu pelo meu ar de felicidade...
ResponderExcluirp.s.: a lei da compensação universal existe!!! Explico no próximo post.
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